segunda-feira, 4 de abril de 2011


Sou Ser...


Sou a brisa que levemente arrepia a pele e transcende o frio


Sou o próprio frio, que nos brinda com sua estação



Sou a estação que permanece avessa à formalidade


Sou dividido em tempo e em sensações


Sou as sensações que traduzem nosso dia a dia


Sou o dia que supre a falta da noite


Sou a noite que cobre a folga do dia


Sou a vida que nasce e se abre na flor


Sou a vida que gera e forma um clã


Sou a nudez que explica a simplicidade


Sou o sorriso que estampa a face infantil


Sou a esperança exposta na mesma face


Sou a insanidade que expõe a ignorância


Sou a fidelidade que carrega a confiança


Sou a metamorfose que dá vida a uma borboleta


Sou a sensibilidade de uma canção


Sou o ouvido de um maestro


Sou a arte exposta na parede


Sou o drama explicito no cotidiano


Sou pobre, sou rico, sou e existo


Sou a falha, sou o êxito, sou a culpa e a absolvição


Sou o prazer e a vergonha, sou displicente


Sou o âmago e o infinito, sou redundante


Sou a heresia, sou o costume, sou o que você pretende ser


Sou o fato, sou a hipótese, religião e ciência


Sou prazer da surpresa e a ansiedade de esperar


Sou o pecado e o perdão, sou a crença e o ateu


Sou meu, sou teu e não sou de ninguém


Sou aquém de tudo e além de nada


Sou a imortalidade e sou o fim


Sou a dúvida e a certeza, a verdade e a inverdade


Sou o real e o irreal, sou assim e não quero mudar


Sou tudo, sou nada, sou o corrimão e a escada


Sou o que sobe e o que desce, sou o fracasso e sucesso


Sou o ódio e amor, o rancor e compaixão


Sou além do que seus olhos podem ver


Sou o que o coração poderá sentir


Sou razão e emoção, sou um ser e serei sempre, sou eu.


D. L.

domingo, 3 de abril de 2011

Meus Passos

Os anos passaram em minha vida,

deixando mudanças.

Os anos passaram em minha vida,

deixando marcas de felicidade e dor.

Os anos passam em minha vida.

No entanto, não consigo frear.

Frear esse ritmo acelerado de meus passos,

para saborear os anos que faltam dessa minha vida.


RF

Eu sou o produto da minha geração,
O resultado do tempo que passou,
A vítima do meu orgulho,
Um adorável divertimento,
O silencio após aplausos,
Expectativas e desencantos,
Eu sou os olhos de um amigo,
Um perigo repentino,
O inesperado esperado,
O fato óbvio de que havia parado de esperar,
eu sou as histórias que invento,
eu sou o conto de fadas de anteontem
e eu sou o que você quer que eu seja a partir de amanhã


(baseado no poema "Retrato" de Cecília Meireles)
Bibiana Rossi

sábado, 2 de abril de 2011

Princípio Da Velha Lápide

Olhos profundos e entristecidos


Que no parapeito da descrença visam um horizonte incerto e distante


O caminho que leva ao lugar perdido está sendo percorrido


Enfim, um abrigo interno e pessoal aconchega o Ser viajante desesperado...


Mas existe uma linguagem dentro das trevas da mente,


Onde os ventos ferozes não têm direção...


Para sentir pelo menos o cheiro de alguma resposta


É preciso adocicar a sensibilidade;


Adocicá-la com o desejo febril de transpassar qualquer ápice,


Qualquer busca de algum sentido nesse mar subjetivo.


É preciso não repugnar o fel ou o gozo...


É preciso, pelo menos, ser Humano...



G.K. e Daka

quinta-feira, 31 de março de 2011

O Espantalho

Hoje eu me encontrei com o espantalho. Faz dias que eu o ignoro, quando passo por ele desvio o olhar e finjo que não vi. Hoje porém, ele foi mais rápido. Quando pensei em virar o rosto e ignorar, ele já me fitava, mudo, esperando que eu admitisse o meu ato falho.

Hoje, depois de tanto tempo, o espantalho e eu acertamos as contas pendentes entre nós.

Levei alguns segundos para me recompor do susto daquele encontro.

O espantalho que hoje me fitava, não era o mesmo que habitava minha memória.

Sobre seus ombros cansados caiam cabelos pesados e sem vida, sua pele pálida se confundia com o branco fantasmagórico daquela aparição. Seu rosto estava desfigurado, os retalhos que sobraram escondiam a melancolia que se alojou próximo aos olhos, e os vincos de tristeza que marcaram a pele de maneira irreversível.

Um tom cinza tristeza ocupava o lugar do azul anil que um dia coloriu aqueles olhos. Fazia muito tempo que a cor daqueles olhos havia mudado. E entre os lábios, surgia um sorriso-coringa, sem expressão, sem nome, sem vida. Aquele sorriso apagado me atingiu tal qual flecha e se alojou naquele lugar aonde costumava bater meu coração. Agora, impossível arrancar o sorriso doente de lá sem arrancar pedaços de coração junto.

Hoje o espantalho nada falou. Nunca precisou fazer isso pra causar danos em mim. Seus olhos, sombreados pelo escuro daquelas pestanas que pareciam querer dormir para sempre me acusavam.

O espantalho sabia quais das minhas dores mais machucam. Seus olhos me acusavam das vezes em que fui leviana com o coração dos outros, das vezes em que fui cruel com o meu próprio. O espantalho aparecia para me acusar dos maus tratos que me infringi. Seus olhos, seu sorriso me perguntavam incessantemente para aonde eu havia enviado meus sonhos. O que eu fiz com a criatura feliz que habitava meu corpo? Para debaixo de que tapete eu varri os meus desejos, aqueles loucos, impossíveis, tão meus e tão reais.

A minha voz trancou, as palavras vieram até minha boca e eu as engoli, se perderam em algum lugar no meu peito, ou na minha alma.

O espantalho me acordou pras vezes em que silenciei quando devia falar e quando falei na hora certa de calar.

O espantalho ria. A minha dor aumentava.

Petrificada diante daquela criatura que invadiu meu intimo pra me cobrar tudo o que eu não fiz de mim, consegui levar as mãos aos ouvidos na tentativa de não escutar aquela gargalhada que me rasgou por dentro.

Inútil, a alma guardou o que a mente vai esquecer. Por quantos anos ouvirei soar aquela gargalhada desesperada? Ansiando por vida, por pulso, por sangue?

Silêncio....

Um carro buzina impaciente, o som da rua me traz de volta a realidade. Meu quarto escuro começa a se encher com os sons vindos da rua, na cidade que começa a acordar. A vida pulsa lá fora.

Prendo meus cabelos, recoloco meu pijama. Hoje não é um bom dia pra sair daqui.

Quando a noite voltar eu tirarei meu espelho do quarto e quebrarei em mil pedaços.

Me reencontrar com meu reflexo, em forma de espantalho, nunca mais.

Gabriela Gehlen

O primeiro e o depois confundem-se na ânsia de viver feliz. Pensamos nas conseqüências sem deixar a vida nos levar. Atos pensados e estudados nem sempre seguem caminhos ditos lógicos. Queremos ver flores sem ter o trabalho de semear o jardim. Reclamamos da chuva e não apreciamos os dias de sol. Somos juízes quando a nossa vontade não é obtida. Devemos seguir o impulso de viver primeiro e deixar acontecer o nosso depois. Esquecer o passado e viver intensamente cada momento.

(Baseado no poema Quem sabe um dia, Mário Quintana)